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Desafios operacionais versus condições climáticas extremas

Desafios operacionais versus condições climáticas extremas

As mudanças climáticas têm causado um impacto crescente em diversos setores da economia mundial e o setor de aviação não é exceção. Em 2024, fenômenos climáticos extremos, como as intensas queimadas, chuvas torrenciais e nevoeiros afetaram significativamente a operação das companhias aéreas, gerando desafios logísticos e de segurança para os voos.

Florianópolis, uma das principais cidades turísticas e comerciais do sul do Brasil, enfrentou, especialmente em 2024¹ ², o fenômeno climático do nevoeiro intenso, que impacta diretamente as operações aéreas no Aeroporto Internacional Hercílio Luz.

Esse fenômeno é caracterizado por uma densa camada de névoa que reduz a visibilidade, dificultando a navegação das aeronaves, especialmente durante as manhãs e noites mais frias.

O nevoeiro em Florianópolis é particularmente problemático devido à topografia da cidade, que favorece à formação de nevoeiros densos sobre áreas mais baixas e o aeroporto, que está localizado em uma região costeira com grande variação de temperatura entre o dia e a noite.

Diante deste cenário, atrasos e cancelamentos de voos são frequentes, além de aumentar os desafios para as companhias aéreas e os controladores de tráfego aéreo, que precisam garantir a segurança nas decolagens e nos pousos.

A visibilidade reduzida afeta diretamente a capacidade de pilotos e controladores para operar aeronaves com segurança, exigindo tecnologias de navegação precisas e protocolos mais rigorosos de controle de tráfego aéreo. Além disso, o impacto econômico do nevoeiro em Florianópolis é significativo, pois afeta a pontualidade das operações aéreas e pode prejudicar o fluxo de passageiros e cargas para a região, afetando a economia local, especialmente no turismo e no comércio.

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Em resposta a esses desafios, as companhias aéreas têm investido em treinamento especializado para suas equipes e adotado tecnologias de radar e sistemas de navegação mais avançados, que possibilitam voos mais seguros e eficientes, mesmo em condições adversas.

Caso fortuito e a ausência de responsabilidade civil

É indiscutível que os nevoeiros impedem a decolagem ou aterrissagem, em especial no Aeroporto Internacional de Florianópolis/Hercílio Luz e no Aeroporto Internacional de Navegantes – Ministro Victor Konder. E por conta disso, as demandas judiciais contra as companhias aéreas se intensificam.

Em Santa Catarina, foi registrada uma média de dez ações judiciais por dia e um acumulado de 2.068 casos em 2024. Já nos últimos dois anos, a variação foi de 53% com um aumento de 2.097 para 3.215 processos, conforme dados do Conselho Nacional  de Justiça (CNJ).

As centenas de ações ajuizadas vinculadas a eventos como o nevoeiro frequente em Santa Catarina visam à responsabilização das companhias aéreas pelo atraso, cancelamento e alterações operacionais decorrentes destes eventos climáticos.

É certo que as companhias aéreas realizam adaptações constantes, ajustando suas operações e programações de voo de acordo com as possibilidades técnicas, com a necessidade de reprogramação e alteração de rotas de maneira rápida, o que afeta diretamente o planejamento e a coordenação dos voos, o que gera efeito imediato aos consumidores.

Neste cenário de total instabilidade frente às mudanças climáticas bruscas, posta de forma reiterada nos aeroportos citados, levam as companhias aéreas à defesa da ausência de responsabilidade frente aos efeitos causados pela condição climática (nevoeiro) que impede a operação, além de demonstrar que a alteração do clima é um evento fora do controle da companhia aérea.

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Adequado, portanto, reconhecer que a condição climática adversa é caso fortuito ou força maior, definido pelo artigo 393 do Código Civil Brasileiro, que estabelece que o devedor não responde por prejuízos resultantes de acontecimentos imprevisíveis e inevitáveis.

No contexto da aviação, condições climáticas extremas, como tempestades, nevoeiros densos ou furacões, são frequentemente invocadas como exemplos de força maior para que seja rompido o nexo de causalidade e, por consequência, seja afastada a responsabilidade civil, mantendo-se a comunicação clara sobre o atraso ou cancelamento, oferecimento de hospedagem e transporte, dentre outras assistências que são aplicadas caso a caso, com respaldo na Resolução nº 400 da Agência Nacional de Aviação Civil.

Neste sentido, para que seja minimamente possível controlar a crise decorrente da instabilidade climática e o ajuizamento em massa de ações voltadas para o nevoeiro que reiteradamente assola o Sul do país, os governos e os órgãos reguladores estão desenvolvendo políticas que promovam uma maior resiliência da aviação às mudanças climáticas.

Em 2024, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e outros órgãos internacionais começaram a intensificar os debates sobre a adaptação do setor aéreo às mudanças climáticas, com foco na sustentabilidade e na segurança operacional. O futuro da aviação dependerá, em grande parte, da capacidade do setor em se adaptar de maneira eficaz a um ambiente climático cada vez mais imprevisível.

Importância das notas técnicas para avaliação meteorológica

É indiscutível que as mudanças climáticas impactaram de maneira significativa o ano de 2024, resultando no aumento da litigiosidade relacionada a atrasos e cancelamentos de voos devido às condições

meteorológicas adversas. E como consequência, houve uma crescente atenção à complexidade técnica que envolve a interpretação da codificação.

Explica-se que para avaliação da condição climática no momento do voo, é necessário acessar as informações do voo através do VRA no site da Anac e, posteriormente, inseri-los no Metar (Meteorological Aerodrome Report).

Após a inserção dos dados históricos (localidade, data e hora), o METAR indica uma mensagem codificada. Considerando a complexidade técnica para interpretação desses códigos quando inseridos nos processos. Dessa forma, tem-se como solução a utilização de um decodificador que leva a conclusões

incontestáveis quanto à possibilidade ou não de aeronavegabilidade.

Devido à importância do tema no cenário atual, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina publicou Nota Técnica em 25 de julho de 20248, que reforça que os informes meteorológicos do Metar são totalmente fidedignos, pois são fornecidos por órgão técnico oficial externo, mediante análise integrada de radares meteorológicos o que têm garantido a utilização destes dados como meio de prova9.

Os desafios climáticos em 2024, como a ocorrência de nevoeiros em Florianópolis, evidenciam a necessidade de adaptação constante do setor aéreo, com investimentos em tecnologia, segurança e sustentabilidade. Reconhecidos como casos fortuitos, esses eventos demandam esforços integrados de companhias, órgãos reguladores e governos para mitigar seus impactos, garantindo a continuidade das operações em um cenário climático cada vez mais imprevisível.

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1 Disponível aqui.

2 Disponível aqui.

3 Disponível aqui.

4 Disponível aqui.

5 Disponível aqui.

6 Disponível aqui.

7 Disponível aqui.

8 Disponível aqui.

Paloma Ricardo de Castro – É advogada consumerista no Lee Brock e Camargo Advogados, pós-graduada em Direito Processual Civil pela PUC-SP e em Mediação e Arbitragem pela FGV.

Lucas Leonardo – É advogado consumerista no Lee Brock e Camargo Advogado, pós-graduado em Processo Civil, na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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